A verdadeira origem do Baralho Cigano

Mademoiselle Lenormand foi uma famosa cartomante francesa, que viveu entre 1772 e 1843. Em sua biografia, "Mlle Lenormand: Profetisa ou feiticeira?", podemos ler:

"Não só foi a vidente mais popular das primeiras décadas do século XIX, como se mantém como a adivinha mais célebre de todos os tempos. Sua popularidade parece dever-se bastante aos seus escritos, nos quais diz ter estado com pessoas famosas e ter ser tornado a confidente da Imperatriz Josefina (esposa de Napoleão), de quem publicou as alegadas “memórias secretas”. Embora sejam praticamente esquecidos hoje em dia, Mlle. Lenormand escreveu quatorze livros, nenhum sobre suas teorias do Tarô ou métodos de cartomancia, e sim sobre sua carreira e suas ligações com pessoas importantes. Sua preocupação não era a de popularizar uma teoria ou sistema práticos, mas propagar a crença em seus poderes como uma sibila."




Mademoiselle Lenormand era conhecida como a Sibila dos Salões e, como fica claro em sua biografia, era uma mulher ambiciosa em busca de fama na corte francesa. Em seus livros ela narra suas consultas para algumas pessoas importantes, descrevendo cartas do tarot, cartas comuns e sibilas da época. Em nenhum de seus livros ela fala sobre a criação de um novo oráculo! Ela nem mesmo deu aulas de cartomancia.

Talvez vc já tenha ouvido falar que o Petit Lenormand, conhecido aqui no Brasil como Baralho Cigano, ganhou seu nome por ter sido criado por ela. Mas essa história não tem nenhuma comprovação histórica... pelo contrário! A História nos conta de maneira clara como esse oráculo surgiu e por que ele ganhou o nome da famosa cartomante francesa.




Esse baralho já aparece em catálogos de vendas na Alemanha a partir de 1798. O autor é Johann Kaspar Hechtel, um alemão de Nuremberg. Ele não foi criado para ser um oráculo, e sim um jogo! Era chamado de O Jogo da Esperança.

Era um jogo de tabuleiro, e o fato de ser em cartas, tornava-o fácil de ser carregado. Nesse jogo, as cartas eram dispostas em ordem numerada e os jogadores seguiam um caminho jogando dados. Esse tabuleiro é o que depois, acabou dando origem ao que conhecemos hj como Mesa Real, com 4 fileiras de 8 cartas e uma fileira de 4 cartas.

O autor do jogo faleceu apenas 2 anos após a publicação, e os direitos autorais passaram a pertencer a editora, q seguiu vendendo o jogo durante os 20 anos seguintes. O dono dessa editora era assíduo frequentador dos espetáculos sobrenaturais que ficaram muito populares na Europa do século 19, e a editora passou a publicar muitos livros sobre ocultismo.

Posteriormente, também foram incluídos naipes, assim as cartas poderiam ser usadas tanto no formato do tabuleiro quanto como cartas convencionais. Isso tornou o Jogo da Esperança extremamente popular na Europa do início do século 19.

Esse momento também foi um boom na cartomancia europeia, muitas sibilas surgindo e os chamados ‘baralhos de conversação’ se tornando extremamente comuns! 

Assim, aproveitando esse hype, em 1845, a editora alemã Reiff, publicou esse jogo em forma de sibila, com o nome Petit Lenormand. Foi criado um pequeno livreto com palavras chaves associadas a cada imagem, que passou a acompanhar o jogo, explicando q este também poderia ser usado para pequenas adivinhações. 

Foi uma jogada de marketing da editora usar o nome da célebre cartomante que havia falecido apenas 2 anos antes, em 1843. Sabemos através da biografia de Mademoiselle Lenormand, que ela nunca criou nenhum oráculo, nem sequer deu aulas de cartomancia. É q o nome da famosa cartomante elevava as vendas! E assim, nasce o q hoje chamamos de Escola Europeia do Lenormand.

E por que ele ganhou o nome de Baralho Cigano quando chegou em terras brasileiras? 




Em 1856, cerca de 11 anos depois de sua criação, há o primeiro registro de anúncios de jornal no Rio de Janeiro, de cartomantes q usavam o “sistema lenormand”. Esse oráculo teve forte entrada nos cultos de origem africana, sendo criados novos significados para essas cartas, associando suas imagens aos Orixás e entidades.

A partir do surgimento da Umbanda, no início do século 20, o Petit Lenormand passa a ser utilizado por entidades durante consultas, e muitos médiuns atuam como cartomantes. Assim, foram associando símbolos da cultura popular brasileira às cartas do Lenormand, surgindo também diversos baralhos de entidades, como Maria Mulambo, Zé Pilintra e Maria Padilha.

No final dos anos 1970, uma médium e cartomante do Rio de Janeiro, chamada Katja Bastos, através de sua Cigana espiritual, sincretizou o Lenormand aos Orixás, agregando valor de mitologia a esse oráculo. Ela desenvolveu um Baralho que traz simbologias dos Orixás junto com as demais representações já conhecidas do Lenormand, e o batizou de Tarot Cigano. Ela o fez buscando o significado de encruzilhada que a palavra tarot carrega em sua origem, justificando que este seria o Caminho dos Ciganos, ou seja, uma ferramenta oracular de contato com entidades ciganas ou mediado por elas, que auxilia na interpretação do nosso caminho. Katja Bastos é considerada a mãe da Escola Brasileira do Lenormand.

Inclusive, o nome 'Baralho Cigano' é algo inerente ao Brasil. A escola europeia conhece esse oráculo apenas como Petit Lenormand.

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