Lua Cheia em escorpião 2019 – “Muitos serão chamados, mas poucos escolhidos”

Nesse último sábado a Lua chegou na sua fase Cheia, Ela no signo de escorpião e o Sol em touro. Esse eixo de signos opostos complementares, parece nos lembrar que a vida material e a espiritual são uma só. Enquanto touro quer laborar a terra, fazer crescer, acumular, desfrutar… escorpião quer soltar, transmutar, aprofundar, limpar, morrer e renascer… Um de frente pro outro, em conversa franca e aberta, nos ensinam que pra comer, tem que trabalhar. E pra trabalhar com amor, tem que querer/desejar se dedicar! 

Como não poderia ser diferente, o bruxo aqui participou de um ritual muito bonito e profundo! Fui consagrar ayahuasca, essa medicina que tanto já me ensinou e continua me ensinando! Gratidão! 

Fui o último a chegar no ritual, depois de muitas horas de espera nos terminais de ônibus de Florianópolis. Eu respirava fundo vendo o tempo passar e conversava comigo mesmo, já na certeza de que isso também fazia parte do meu trabalho. Eu que sempre tive muita dificuldade em apenas aceitar o que não posso mudar. Eu que luto contra o desespero de berrar que tá errado a forma como os poderosos organizam a cidade, que é muito injusto o que eles fazem a população passar. Mas não é algo que eu tenha poder de mudar. Não agora, muito menos sozinho. 

“Aceite”, eu dizia pra mim mesmo, “você tem que esperar”. 

Cheguei ao local já cheio, procurando deixar pra trás aquela ansiedade da viagem. Era um lugar novo pra mim, fui por indicação de uma amiga que não estava presente. Pensei em convidar alguém pra ir comigo, mas a intuição me pediu solidão. Seria a primeira vez que participaria de uma cerimônia assim sem nenhum rosto conhecido à minha volta. 

Senti uma energia muito boa logo que atravessei a porta. Cheguei procurando um lugar pra sentar e me acomodar, buscando respirar. Olhei em volta, para o ambiente, e vi, bem no centro, uma roda medicinal. Um tapete redondo com velas e incensos dispostos em círculo, plantas, água, um grande caldeirão e, ali no meio, uma imagem do Arcanjo Miguel com um globo terrestre ao seu lado. Mais adiante, em frente ao altar principal, havia uma mandala desenhada no chão, com símbolos e velas. 

Não demorou muito para a moça que presidia a sessão começar. Dentre os recados e avisos aos marinheiros de primeira viagem, ela começou a nos falar sobre as dores que nosso planeta vem sofrendo. Pediu que olhássemos para o globo ao lado do Arcanjo e nos lembrássemos que somos responsáveis pelo estilo de vida que levamos. Sim, Mãe Gaia chora dia e noite! 

Botei a mão no pescoço em busca do meu amuleto, um pingente de cianita azul, a própria espada de São Miguel. Me emocionei… ergui os olhos e vi a vela no centro da mandala começar a chorar muito! Logo em seguida a moça disse uma frase de efeito que agora minha mente não recorda, e imediatamente pássaros gritaram na janela! Eles concordavam! A vela concordava! Mãe Gaia chora dia e noite! Eu também choro nesse momento que escrevo… 


meu amuleto de cianita, a espada de São Miguel


O primeiro despacho veio chegando devagar. Eu passei a semana envolto em reflexões sobre o amor, e meu pedido à ayahuasca foi que me retirasse o senso de obrigação, já faz um tempo que quero apenas fazer, ser, viver… com amor! A obrigação carrega dor, é o trabalho que veio da palavra latina tripalium, um instrumento de tortura, utilizado para forçar animais e escravos a produzirem mais. E eu quero aprender a fazer tudo em minha vida com o coração, sem obrigação. 

Foi aberta a cerimônia e começou a tocar uma meditação guiada, que chamava por Miguel, e sua espada cortava todas as amarras. Fui sentindo os meus já habituais tremeliques e, na minha mente, eu via grossas cordas sendo retiradas. “Respira e solta”, eu repetia mentalmente para mim mesmo. 

Será que consigo limpar a casa com amor ao meu lar, ao invés do peso de que já vai sujar? Será que posso esperar o ônibus com amor pelas conversas breves e profundas com estranhos no terminal, ao invés da raiva dos poderosos? Será que posso aprender pelo amor em vez de pela dor? 

“Me ensina a escolher, Mãe!”, eu pedi. 

Comecei a firmar meus pensamentos nos meus mentores, os que conheço. Mas eles pareciam longe… perguntei quem estava comigo, e ele veio. Tobias! 

Eu tenho visões com ele desde a mais tenra infância, ele esteve comigo em todas as fases da minha vida, de forma consciente! Eu descobri seu nome na adolescência, num centro espírita, mas eu já sabia quem ele era, eu sempre ouvi sua voz e conversei com ele, abertamente. Ele tem muitas formas e muita Luz! Na maioria das vezes eu o vejo numa forma humanoide luminosa, mas ele já se apresentou pra mim como um hindu, também já o vi como um homem moreno de cartola e cachimbo e, um médium, certa vez, me disse ver um indígena norte-americano nele. Ele já me disse que, hoje, tem essa forma luminosa que aparece pra mim, mas transita pelas diversas roupagens que já teve quando encarnado para atuar espiritualmente em várias frentes diferentes. 

Tobias estava bem a minha frente, com toda sua Luz, e me dizia que hoje eu conheceria mais um mentor. Por um segundo minha mente me pegou… “mais um!?” Se a vida é uma escola, cada mentor é um professor. E cada professor significa uma nova matéria, mais coisa pra estudar, mais dever de casa. Respirei fundo e lembrei que fui eu quem pedi pra me libertar das obrigações, então aceita a missão no amor! E eu ri! 

A força foi intensificando, e uma luz cor-de-rosa começou a surgir em algum lugar a minha frente. Não demorou muito para que ela se tornasse um grande túnel pra onde eu fui levado e pude ver todos os meus amores, em ordem cronológica, começando pelo meu último apaixonamento e fui voltando, um por um, amores não correspondidos, amores platônicos, crushes que nunca evoluíram, amores que foram embora, amores adolescentes… até que me vi criança, amando minha mãe e meu pai, e percebi o quanto eu os idealizava, como todas as crianças. 

Então, entrei na última imagem do túnel, literalmente na luz do fim do túnel. 

Eu era um bebê e berrava! Chorava muito alto! E dentro de mim sentia um buraco, um vazio, um desespero que me fazia gritar, gritar muito! Ninguém precisou me explicar, eu sabia exatamente qual era a memória celular que aquela sinapse cor-de-rosa foi buscar. 

Quando eu tinha apenas 3 meses de vida, minha mãe teve uma infecção muito séria, mas não sei de quê. Só sei que ela teve que parar de me amamentar. Cresci ouvindo minha avó materna contar e recontar esse episódio. Vovó dizia que foi uma época de muita preocupação, pois ela e meu avô se revezavam para cuidar da minha mãe que estava de cama, ao mesmo tempo que cuidavam de mim com apenas 3 meses, e ainda lidavam com o fato de que estava acontecendo uma grande greve de caminhoneiros e faltava fórmula infantil em todos os lugares. Ouvi muitas vezes a história de que eles rodavam a cidade inteira procurando comida pra mim. Numa certa tarde, disseram que eu berrava tanto, que meu avô me segurou de um jeito que eu grudei no braço dele e comecei a sugar. Como parei de chorar, ele só deixou, e ficou com um hematoma enorme por vários dias. 

Eu comecei a chorar. E a voz do Tobias se fazia audível, me dizendo que esse episódio foi a marca da minha missão de alma dentro daquela família. E eu entendi! Eles já me deram muitas rememorações, às vezes sinto que as histórias mal cabem na minha cabeça. Eu escolhi nascer nessa família, mesmo ele tendo me dito que eu não precisava, foram muitas vidas de sofrimento ao lado deles anteriormente. Eu me infiltrei nesse núcleo na rebelde tentativa de quebrar paradigmas. O que significa ser totalmente diferente deles. A minha existência, desde outras vidas, personifica muitas coisas que eles nunca aprovaram. 

Mas fui eu que escolhi essa missão! E esse episódio veio pra marcar meu corpo e, logo de cara, me dizer “você vai passar fome com eles… não importa quanto dinheiro eles tenham, não tem fórmula pra vender”. 

Sim, passei muita fome emocional na convivência com eles. E a ayahuasca estava me mostrando que foi esse trauma inicial que gerou todas as minhas carências, e me fez deturpar o sentido do amor. Eu sentia a obrigação da minha avó, de ter que me cuidar… eu sentia a angustia do meu avô, de me dar o braço pra mamar… Eu absorvi obrigação e angustia no lugar de amor. 

"E você sabia que isso ia acontecer”, dizia Tobias. “Sim, sabia”, eu confirmava. 

Abri os olhos marejados e vi, na parede de frente a mim, a imagem de uma elefanta. Na minha miração ela estava viva, colorida, em 3D, mas de fato havia uma imagem naquela parede, mas obviamente imóvel, um desenho. Logo que abri meus olhos, ela se apresentou como uma Grande Matriarca e me disse que poderia me ajudar na minha missão de entender às mães. 

Eu caí no choro e disse a ela “Independente de nossa história cármica, o que aconteceu aos olhos da matéria foi uma fatalidade. Minha mãe ficou doente, ela não parou de me amamentar porque quis. O que poderia qualquer mãe nessa situação fazer? Como impedir que esse trauma se formasse?” 

Ela me olhou com olhos de compaixão e disse “não se podem impedir os traumas de se formarem, eles fazem parte da vida”, e ao terminar a frase sacudiu a cabeça e a tromba de um lado para o outro e, num cantinho, surgiu uma pequena tela, onde eu pude ver uma breve cena do filme Procurando Nemo. Na cena o pai procura seu filho desesperado e diz à Dory “eu não posso deixar que nada aconteça a ele”, e a peixinha desmemoriada responde com sua ingênua sabedoria “ué… mas se nada acontecer com ele… então… nada vai acontecer com ele”. 

Eu chorava e a elefanta tornou a falar “estar vivo é sentir tudo o que há pra sentir, pra não sofrer tem que aprender a lidar com os sentimentos, mas não dá pra impedir de sentir”. No meu pranto eu perguntei “então como faz pra lidar?”, e ela sorriu. “Assim! Exatamente como você está fazendo agora! Buscando ver, buscando sentir e limpar. Se permitindo fluir, sem se apegar. O trauma continua vivo porque você o revive. Seu corpo lembra, mesmo que seu cérebro não.” 

Respirei fundo e voltei a fechar meus olhos. Tornei a olhar para meu berreiro de fome, agora olhava a cena de fora, sem revivê-la, e me lembrei que já sou adulto, que moro sozinho, pago minhas contas e preparo meu próprio alimento. Eu não preciso mais sentir aquela fome! 

Nessa hora, mesmo de olhos fechados, eu via a elefanta, e ela murmurava a música Tempo de Amor

Ah, bem melhor seria 
Poder viver em paz 
Sem ter que sofrer 
Sem ter que chorar 
Sem ter que querer 
Sem ter que se dar

Mas tem que sofrer 
Mas tem que chorar 
Mas tem que querer 
Pra poder amar

Ah, mundo enganador 
Paz não quer mais nunca quis dizer amor (ela modificou essa parte da letra)

Ah, não existe coisa mais triste que ter paz 
E se arrepender, e se conformar 
E se proteger de um amor a mais

O tempo de amor 
É tempo de dor 
O tempo de paz 
Não faz nem desfaz

Ah, que não seja meu 
O mundo onde o amor morreu




Abri os olhos e nos olhamos, sorríamos. 

“Como meus avós poderiam não ter sentido tanta preocupação e angústia?”, eu perguntei a ela, “acho que eu, hoje, como adulto, também sentiria se passasse por essa situação.” 

“Fé!”, ela me respondeu, “só quem caminha na espiritualidade consegue passar pelas provações da matéria sem sofrer. A fé é uma vibração, um estado de espírito, uma frequência. O desafio da matéria é alinhar o coração com frequências mais elevadas.” 

Voltei a fechar meus olhos e tive a sensação de que meu coração e meu cérebro travavam uma certa batalha naquele momento. A elefanta voltou a sacudir sua cabeça e sua tromba, e mais um flash de desenho animado se fez presente, agora eu via um dos episódios finais da saga da Lenda de Aang, Avatar, quando ele sai numa jornada espiritual, só que dessa vez no mundo físico. Ele se encontra com um grande Ser ancestral que toca ele na testa e no peito ao mesmo tempo, e assim o menino passa a saber o que fazer. 

Eu tive o entendimento do deslocamento que a Matrix provoca, o excesso de racionalidade que nos faz dar pouca atenção aos sentimentos. O cérebro fala com palavras, a gente tem a péssima mania de achar que palavras comunicam, e eu ouvia Belchior “a gente se desentende no instante em que fala”. Eu via pessoas ligadas a aparelhos com o coração ainda batendo, o cérebro pode desligar que a ciência ainda te manterá nesse corpo. Morte cerebral. Mas quando o coração decide que não vai voltar… o cirurgião pode dar quantos choques achar necessário, nada o fará voltar a pulsar. Muitas cenas hospitalares passaram correndo. Muitas cirurgias, corações expostos, cérebros expostos, choques, fios, aparelhos… 

O coração é o centro do corpo. A função do cérebro deveria ser interpretar os comandos do coração. Mas o coração não fala com palavras… ele fala como um tambor! Para ouvir o coração precisa falar a língua da vibração! E essa é a língua do Universo também! 

Pra entender a espiritualidade é preciso saber interpretar metáforas. É preciso exercitar a arte. 

Voltei a abrir os olhos e lá estava a elefanta, sacudindo sua tromba, com um ar alegre. Eu fui me conectando ao seu bailado, à música que tocava… quando chamaram para o segundo despacho. 

No primeiro despacho a moça me perguntou se eu sabia qual era minha dose, e eu fiquei confuso. Dessa vez, assim que me levantei, ouvi o Tobias dizer “três quartos”. E assim foi. 

Voltei a sentar e encarar a elefanta com seu bailado. Devagar suas cores começaram a ficar mais e mais intensas, e no padrão do seu couro começaram a se formar mandalas e mais mandalas. Comecei a me sentir levemente zonzo e entendi que agora ia começar a fazer limpeza, afinal, essa não era minha primeira vez, e eu já entendia os sinais. 

Primeiro comecei a sentir frio… e Tobias me perguntou “está pronto pra morrer?”. Eu respirei fundo, meu cérebro quis formar palavras de medo, respirei mais uma vez e respondi que sim e fechei os olhos. 

A elefanta brilhante sumiu e tudo ficou escuro. Então, vi dois olhos vermelhos começarem a se formar onde antes a Grande Matriarca brilhava, e ali surgiu uma enorme figura encapuzada, com uma foice gigante na mão direita. Era a Morte, em pessoa. Tobias repetiu, agora com a voz mais grave e forte “está pronto pra morrer?”, e eu respondi “sim”. 

A Morte me cortou a cabeça. 

Enquanto minha cabeça caia a Morte sumia, sua missão ali estava cumprida. Vi o sangue esguichar da cabeça e do corpo que caíam no escuro… Antes que meu sangue pingasse no chão, surgiu Kali, com sua potente língua, lambeu meu sangue e me senti voltar a subir, e Ela foi ficando cada vez maior. Eu a via bem no meio do caldeirão da roda medicinal. Em um de seus braços esquerdos, ela carregava uma potente fonte de Luz, era tão brilhante e intensa que eu não conseguia identificar o que era, pois não se podia olhar naquela direção. Esse era o único braço imóvel, com os demais a Deusa bailava e sorria agitando sua língua. 

Eu estava preso ao seu dedo mindinho imóvel, pendurado. Eu não tinha medo de cair, me sentia seguro, mas, ao mesmo tempo, o que via era aterrador! 

A fonte de Luz que a Deusa carregava fazia com que tudo, do equador de seus ombros pra cima, fosse cada vez mais iluminado e, dali pra baixo, cada vez mais escuro. O chão parecia um pântano de petróleo. A Deusa dançava e pisoteava a superfície daquele denso líquido onde era possível ver muita gente se afogando. Eu via ciclos e mais ciclos reencarnatórios de pura dor, sofrimento e horror. Via bebês brotarem já esquálidos, com enormes bocas abertas, cresciam aos prantos, vazios, suplicantes, cresciam e definhavam! Sempre de bocas abertas! Mãos estendidas! Implorando salvação! Morriam pela boca e renasciam imediatamente do mesmo buraco que haviam deixado, e assim o ciclo se repetia com milhares de mandalas cinzas, cadavéricas, respingando petróleo! 

Eu pisquei tenso depois dessa visão, fechei a minha boca que estava aberta estatelada de susto, e ergui a cabeça consciente de que eu não estava lá embaixo, eu estava pendurado na pontinha do mindinho de Kali. De onde eu estava, a Luz já alcançava e me permitia enxergar, mas eu estava bem consciente de ainda estar do equador pra baixo. Virei a cabeça para olhar para a Deusa, no mesmo instante Ela me encarou de volta, sem interromper seu frenético bailado. Com seu sorriso ela me disse em sentimento que eu estava no casulo e pra ver a Luz só precisava liberar minhas asas. Senti Kali contar que a “salvação” é a própria iluminação, mas ninguém pode arrancar da cegueira quem não quer enxergar. Só se pode iluminar o caminho, não se pode caminhar pelos outros. 

Kali ergueu os olhos e eu a imitei. Acima de mim, no equador, haviam nuvens… e, por detrás delas, estava Zeus, imenso, majestoso, poderoso, com seus raios! 

Ele disparou o primeiro raio diretamente em mim, senti um choque me atravessar a coluna vertebral. Foi tão forte que dei um pequeno pulinho na cadeira e abri os olhos momentaneamente. Depois, Ele ainda disparou mais um segundo, e mais um terceiro raio, que também me atingiram em cheio. Eu tremia de choque e de frio. 

Zeus gargalhava, e me lembrou da história da borboleta. “Se alguém te livrar do esforço de sair do casulo, você morrerá” dizia ele, “e voltará lá pra baixo. Pra poder usar suas asas, tem que exercitá-las. Tem que doer pra crescer.” E ele me mostrava seus músculos, orgulhoso! 





Eu voltei a encarar Kali que me lembrou que meu elemento é o Ar, portanto era óbvio que eu tinha asas. E soprou sobre mim… 

No casulo eu me senti. Tudo ficou escuro e a voz do Tobias novamente ecoou “agora seu corpo vai sentir a metamorfose”. 

Um calorão começou a subir, como uma febre alta, eu me sentia em chamas, um suador tomou conta de tudo! Respirei fundo e afastei um pouco a cobertinha… pronto… era hora da limpeza! Tava demorando! 

Então, de repente, ouvi a voz da minha Preta Velha à minha esquerda “tem que limpar fio… pára de brigar…” eu comecei a sentir cheiro de tabaco “vai tê febre até as toxina sai tudo”. 

“Febre é muito ruim, vó”, eu lamentei. 

“É meix… quer vomitar? Vomita que passa rápido!”, ela disse. 

Eu peguei um balde ao meu alcance e meu estômago começou a revirar, mas minha cabela dizia “não quero vomitar!”. O coração começou a disparar… ou ouvia uma criança manhosa chorar. 

“Tem que sair, fio… ficá doente é chato meix… o remédio cura, mas só se você deixar sair as toxina tudo”, a vó cachimbava e falava. 

Eu comecei a tossir e a ânsia de vômito vindo forte, mente e coração ainda em guerra. “Não tem outra forma de limpar?”, perguntei, e meu intestino borbulhou. “Ótimo!”, disse o cérebro prontamente “prefiro cagar que vomitar ou ter febre”. 

“Pronto!”, a Vó disse num gritinho enquanto mexia na fumaça com as mãos. Imediatamente o calor abaixou levemente. “Então vai pro banheiro!”, completou a Vó enquanto meu intestino borbulhou com mais intensidade, mas eu ainda estava fraco, trêmulo e suado… Ergui a mão e pedi ajuda… uma das moças da assistência me ajudou a chegar ao banheiro. “Pronto!”, a Vó dizia novamente no mesmo tom. 

Gratidão! 

Foi rápido e feio. Mas acabou! E, como num passe de mágica, eu já não tinha mais calor, ou enjoo, ou dores. Apenas alívio! 

Saí do banheiro e dei de cara com a mandala desenhada com símbolos e velas, em frente ao altar principal. Nos recados iniciais a moça havia falado que, quem sentisse, poderia entrar ali para uma cura, em algum momento. E eu senti que era meu momento. 

Me dirigi ao local indicado e entrei na mandala. Imediatamente me senti atravessando um portal de pura Luz, eu estava num tubo de uma Luz vibrante e morna, branca e dourada. Perguntei que fogo era aquele, e vi o próprio Cristo diante de mim, com seu coração exposto e sua coroa iluminada. E eu percebia que toda Luz ali presente, vinha de sua coroa. 

Cristo me disse que eu sou um mensageiro, me lembrou mais uma vez, que sou um Guardião do Ar e que sabia o motivo pelo qual eu temia as palavras. Ele disse que todas as suas palavras escritas, foram e ainda são usadas para dominar, guerrear e conquistar. Mas a palavra foi feita para se interpretar e apenas quem não souber ler vai se deixar manipular. Cristo disse que quem quiser aprender pelo seu exemplo, conseguirá interpretar suas palavras. 

Ele me mostrou o símbolo do YinYang… e eu sentia… as palavras no Yang… o exemplo no Yin… 

Cristo dizia que não se pode ensinar só pregando, é preciso viver suas próprias palavras, senão você morrerá pela boca. E Kali já havia me mostrado o que isso significava. 

Ele me pediu para que eu não tivesse medo de divulgar minhas palavras, disse que entendia o medo de ser humano e imperfeito, entendia o medo de morrer pela boca, e me disse que era chegada a hora de descobrir minhas asas. Me pediu que eu estudasse as escrituras, os anjos e os santos… Me olhou com ar de professor e senti Ele me perguntar se eu tinha medo de não saber ler também? 

Eu vi uma porta dourada se abrir e entendi que era hora de sair da mandala. 

Saí agradecendo e sorrindo. Me sentia renovado. Voltei ao meu lugar e lá estava a elefanta bailando sua tromba. Ela sorriu pra mim e eu retribuí. 

Fechei os olhos e comecei a sentir um formigamento nas costas. A voz do Tobias voltou a se fazer audível “está pronto pra conhecer seu Ando da Guarda?” 

“Meu Anjo da Guarda?!”, me surpreendi… “Esse é o novo mentor?”… Tobias deu uma gostosa gargalhada. 

E do alto começou a descer um ponto de Luz verde… Eu olhei e vi um radiante Ser alado vindo na minha direção… Era um Anjo… com enormes asas plumosas brancas, com brilhos purpurinados de dourado. Ele veio vindo e ficando cada vez mais nítido… tinha longos e brilhantes cabelos castanhos, volumosos e sedosos, levemente ondulados, seus olhos também castanhos tinham um brilho esverdeado, ele vestia uma túnica branca e verde, na mão esquerda carregava um cajado e na direita algo prateado que eu não identificava… ele emanava muita paz e tranquilidade, e eu sentia que ele fazia tudo vibrar diferente. 

O Anjo me abraçou carinhosamente e tocou minhas costas bem na região que sentia o formigamento. Eu retribui o abraço e perguntei seu nome. 

“Raphael”, ele respondeu me olhando nos olhos. 

Eu chorei. Esse nome me acompanhou durante toda minha adolescência. Eu tinha muitos sonhos, intuições e sinais com esse nome. 

Ele bateu suas enormes asas e o vento fazia tudo vibrar verde. Eu fui sentindo vários tremeliques com aquele vento e, aos poucos, o Anjo foi voltando lá pra cima. E eu me senti rompendo o casulo. 

Voltei a sentir calor, mas agora já não era febril. Tobias me pedia pra respirar. Fui respirando e me sentindo inflando minhas asas. Voltei a ver uma criatura alada, mas agora não era o Anjo… me perguntei se era uma borboleta, mas escutei “eu sou a mariposa”. 

Ouvi a moça abrir para o rapé… e lá fui eu… 

Depois do sopro, ouvi um pajé entoar um lindo canto e invocar um beija flor. O pássaro era verde também, me rodeou e subiu aos céus. Voltou junto de Raphael. O Anjo brilhava branco e verde, e o beija flor dançava ao redor de seu cajado. 

Durante algum tempo ele voaram, apenas emanando suas Luzes. 

Então a moça anunciou o fogo no caldeirão… e ali haviam pequenas labaredas verdes… 

O final da cerimônia foi de dança, e eu sentia muito amor, muita tranquilidade, como nunca havia sentido antes. Era uma vibração muito diferente! Meu coração estava leve! 

Gratidão! 

Imaginem qual não foi minha surpresa quando, no dia seguinte pela manhã, numa primeira e breve pesquisa, descubro o evangelho de Tobias, onde ele narra um encontro com o Anjo Raphael. Eu realmente não conheço a Bíblia ou os anjos e santos… Chorei com a sincronia e a história que encontrei naquela escritura. Pensei nos meus traumas com a Igreja… respirei e lembrei que não preciso mais reviver o passado.






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